Como é diferente raspar o Santo na Africa: Candomblé

Postado por: Ebomi at 11:07 0 Comentários

Dando continuidade ao texto completo de como é raspar o santo na África “Feitura de Santo” finalizamos com o resto do texto sobre o culto de iniciação no culto Africano com o texto de uma pesquisa de Pierre Verger, então iremos ao  terceiro dia da iniciação (Ijéta ou Ijéfun), ijéta, é o dia de Ofun, quando o corpo do iniciado é marcado com traços de giz branco.

Nesse dia, realiza-se a primeira aparição em público dos Omo titun. Eles vão todos até o riacho, na floresta sagrada, levada por seus iniciadores. Sua atitude, de completa submissão, revela que eles passaram a um estado de crianças de tenra idade. Andam guiados, quase que colados atrás dos iniciadores, enrolados no mesmo pano branco, como criancinhas nas costas da mãe. Voltam para a igbó ikú, logo saindo novamente com a cabeça e o corpo enfeitados com riscos e pontos brancos traçados com giz (Ofun), sinal de respeito por Obatalá, criador dos seres humanos. Os omo titun dão três voltas pela praça, com passos incertos, e são levados de novo ao local de seu isolamento.

Candomble - Orixa_Yemanja_Orossi

Ijéje – O sétimo dia de iniciação


O sétimo dia, ijéje, é o dia do waj, no qual a cabeça dos m titun é pintada de azul-anil (aro), com acréscimo de desenhos feitos com osùn (ossum), um pó vermelho extraído da casca de uma árvore. O terceiro e o sétimo dia caem no dia semana iorubá dedicado a ifá.

Como é a Iniciação de Orixá na Africa “Parte 1”

Feitura de Santo na Africa – Parte 2

Ijétadogún


No décimo sétimo dia, ijétadogún, quinto dia dedicado a Xangô desde o começo iniciação, chega finalmente o momento em que o m titun torna-se um elégùn e passará a usar um novo nome. Esse dia é marcado por duas cerimônias: a da escolha do novo nome e a da reaprendizagem das atividades da vida diária.

Procura do Odu – Cabala


De manhã cedinho, cada um dos m titun é levado separadamente ao local consagrado a esse deus. O iniciado é sentado sobre um pano branco, de costas para o ojú àngó, e entre suas pernas estiradas coloca-se um odùn àrá, o mesmo que serviu para a sua consagração ao deus no dia de oròíe. Ìyá Xangó pergunta-lhe: “ Procuras o poder do orixá ou dinheiro ?” O candidato responde: “ É o poder do Orixa que eu quero” . Em suas mãos juntas, ele recebe da Ìyá Xangô dezesseis búzios, com os quais fará a adivinhação.

O omo titun esfrega os búzios nas mãos, com elas aponta para os quatro pontos cardeais, para o alto e para o chão, toca-se vezes na testa e joga-se sobre o pano, entre suas pernas. Ìyá Xango examina a posição dos búzios, contando os abertos e os fechados, e em voz alta anuncia o resultado, provocando
comentários dos espectadores.

Os búzios são lançados duas vezes para determinar o odù, ou o signo, que de agora em diante governará a vida do iniciado. Um deles obteve duas vezes o número 6, Obará, que designa Xangô, e foi felicitado por todos os presentes, pois, como veremos mais adiante, esse resultado deu-lhe um nome prestigioso.

Reaprendizagem das atividades da vida cotidiana


Graças à determinação do seu odù, os iniciados encontram uma identidade, uma personalidade, mas falta-lhes ainda reaprender os gestos e as atividades da vida cotidiana. Eles são considerados como tendo esquecido tudo de sua vida anterior, a que precedeu os dezessete dias passados na igbó ikú, a
“ floresta da morte” .
Candomblé na Bahia - Orixa

Os dezoito iniciados são divididos em dois grupos: rapazes e moças. Os primeiros, cercados por seus instrutores, imitam a partida para o campo, com uma enxada no ombro e um cesta na cabeça. Fazem gestos de cultivar a terra, de semear o milho ou subir no tronco de uma árvore para cortar cachos de
dendê. Aos primeiros golpes de facão dados caroços de dendê e grita com uma falsa admiração: “Ah! Que belo cacho acaba de tirar!” As moças fingem ir buscar água no riacho com uma cuia ou um pote na cabeça ou ir apanhar lenha no mato. Os dois grupos voltam ao terreiro ao mesmo tempo e simulam
ir ao mercado, vender e comprar; depois, à volta á casa para acender o fogo, cozinhar, etc.

Todos os gestos da vida reencontrada são executados em uma atmosfera de humor e de alegre descontração depois do longo período de recolhimento, de resignação e de langor passado na igbó ikú. Aproxima-se o fim da iniciação. Colocam-se esteiras no chão, diante do local consagrado a Xangô. Os novos adóù estão sentados entre as pernas estiradas de seus iniciadores, postados atrás deles.

A Ìyá Xangó pronuncia um longo discurso, meio sério engraçado, e faz uma série de recomendações. Associando o gesto à palavra, esbarra o pé em um iniciado sentado à sua frente, puxa-lhe a orelha, toca-lhe a testa declarando: “ Se alguém te der um pontapé, te puxar as orelhas ou te der pancadas na
testa, por descuido ou acidente, não precisas dizer nada, mas se exagerar e o fizer de propósito, é preciso que te vingues”.

como é o candomblé na africa

Em seguida, ela diz: “ Se alguém à noite passasse com uma lâmpada acesa atrás de ti...” . Essa possibilidade sugerida pela Ìyá Shangó teria como conseqüência deixar que o iniciado visse sua sombra (òjìjì), que abriga seu èmi que é, ao mesmo tempo, seu sopro, sua alma, seu espírito e seu princípio vital; isso constituiria um ato repreensível, feito com intenções hostis. Uma das iniciadoras gritou horrorizada quando ouviu evocar um tal sacrilégio e rolou pelo chão, arrastando consigo, por contágio, todos os outros adóù e seus iniciadores. Depois dessa cena de confusão, eles foram levantados e sentados novamente. Todos eles, inclusive os iniciadores, tinham o ar entorpecido que acompanha os transes de possessão.

Passada essa grande comoção, realizaram-se casamentos simulados. Meninos e meninas foram escolhidos, entre os assistentes, para desempenhar o papel de marido ou de mulher aos adóù. As pernas de cada casal foram cruzadas em sinal de união e novas recomendações foram feitas: “ Uma mulher pertencente ao culto de xangô pode ter relações com um homem que não segue o mesmo culto, mas não com um homem que faça parte do gbé Sangó” , e a iniciadora enumerou assim uma série de obrigações e de proibições que decorriam de sua admissão ao culto do deus. Em seguida, ela ensina aos “ recém-casados” a cuidarem um do outro oferecendo-se mutuamente de comer.

A Ìyá Shango comunicou depois a cada um dos novos elégùn o nome que usaria a partir daquele momento. O que achara por duas vezes o sinal de Òbàrà recebeu o nome de Obàdiméjì, ou seja, “ o rei torna-se dois, ele é duplo, ele é rei de dia e ele é rei de noite” . Este nome glorioso foi recebido com o aplauso dos presentes.

A partir daquele momento, pronunciar o antigo nome dos iniciados tornar-se-ia um ato sacrílego, que consistiria em chamar um vivo pelo nome de um morto e, assim, implicitamente, desejar-lhe a morte. Para terminar a descrição das cerimônias de iniciação na África, chamamos a atenção para as
cerimônias de ressurreição dos futuros, sacerdotes do vodun fon Sapata-Ainon, correspondente à Xànpònná - Obalúayé dos iorubás.

Embora observada em Abomey, em pleno território fon no ex-Daomé, essa cerimônia permanece ligada ao grupo de pessoas que falam o iorubá, pois os futuros sapatasi usam. Durante todo o período de iniciação, o nome de ànàgónu (“ os nagôs” ), e a língua por eles falada durante todo o período de sua reclusão é o iorubá arcaico, ainda falado pelos aná, também chamados ifè, estabelecidos na região de Atakpamê, no Togo. Essa cerimônia, da qual já publicamos as fotografias em outras obras, marca a ruptura do noviço com seu passado, através de morte simbólica, e seu nascimento para uma nova vida consagrada a Sapata.

Uma ou duas semanas durante uma sessão de danças e cantos diante do templo de Sapata, os futuros sapatasi caíram no chão, com o corpo retesado, como em estado de catalepsia, morto, como se diz, pelo vodun Sapata. Os corpos foram logo cobertos com panos e levados para o interior do templo. As
cerimônias de ressurreição realizavam-se no próprio local onde os noviços caíram. Um público numeroso estava reunido e os tocadores de atabaque estavam instalados no centro do terreiro sob uma árvore frondosa.

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Aproximadamente às quatro horas da tarde, o sapatanon, “ o grande sacerdote de Sapata” , e três dignitários do templo vieram desenhar no chão um grande retângulo, derramando, sucessivamente cada um deles, rastros: amarelo, de farinha de milho misturada com azeite-de-dendê (veve); branco, de farinha de milho; preto, de pó de carvão vegetal; e, por fim, milho e feijão misturados. Uma esteira de manchas negras, vermelhas e brancas foi trazida e estendida acima dos sacerdotes que realizavam um sacrifício de substituição, oferecendo galos a terra para que ela concordasse em devolver a vida àqueles pelos quais se realizava a cerimônia.

Como é a Iniciação de Orixá na Africa “Parte 1”

Feitura de Santo na Africa – Parte 2

Depois de ter sido levantada e colocada sete vezes no chão, a esteira foi estendida no centro do espaço delimitado pelos traços coloridos. As jarras contendo infusão de folhas foram trazidas. Os “ cadáveres” também foram trazidos para fora do templo, um a um, enrolados em um pano, de cor verde e costurado como uma mortalha. O corpo foi deitado sobre a esteira, abundantemente borrifado com o líquido das jarras, e a mortalha foi enfim descosturada. Uma grande folha foi colocada sobre o rosto do noviço; o corpo apareceu, deitado do lado esquerdo, com a pele esverdeada pela tintura do pano desbotado. Alguns vermes mexiam-se sobre o corpo, mas alguns descrentes afirmavam que eram provenientes de galos mortos que teriam feito companhia ao “ cadáver” em sua mortalha.

Mulheres ajoelhadas massageavam e lavavam o corpo com o líquido contido nas jarras. Sapatonon afastou-se alguns passos e chamou sete vezes o “morto” pelo seu novo nome. Quando se ouviu o último apelo, o corpo começou a tremer e a agitar-se, ressuscitando diante da assistência que aplaudia
e manifestava sua alegria pela vinda ao mundo de um novo ànàgónu. Esse texto retirado de um dos livros de culto ao orixá de Pierre Verger tem a inteção de mostrar a semelhança do Candomblé e o culto africando, mas também como também pode ser muito diferente uma iniciação de Orixá (elegun) na Terra de nossos ancestrais.

Agora Escute Xirê de Ogum em Ketu: Candomblé


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